RELACIONAMENTOS E ELETRODOMÉSTICOS
recebi um e-mail hoje, um texto longo que eu me recuso a postar aqui, porque acho que não vale a pena ser lido. reúne um monte de clichês a respeito do que deve ser um relacionamento, todos baseados numa única premissa, expressa nessa singela frase atribuída a dráuzio valera: "uma relação tem que servir para tornar a vida dos dois mais fácil". confesso que fiz a besteira de conceder cinco minutos da minha atenção à idéia, e que isso foi suficiente para que quinhentos mil protestos me viessem à cabeça.
não sei sequer dizer qual o mais forte. talvez a idéia de que ela coloque a união de duas pessoas (o e-mail levou pro lado do amor, e sigo a mesma direção) no mesmo patamar de um eletrodoméstico. se utilizado o famigerado critério da utilidade, é bem provável que relacionamentos perdessem feio para um. vejamos o microondas, por exemplo. deus sabe que a minha vida ficou muito mais fácil depois que adquiri um. o mesmo não pode ser dito de qualquer dos meus antigos namorados.
acabei me dando conta disso, de que um relacionamento nunca tornou minha vida mais fácil. diferente, no máximo, mas nunca mais fácil. porque muitas coisas que antes eram simples acabavam se tornando grandes problemas depois. se antes eu não me importava se havia dias em que ninguém me telefonava, depois eu ficava doentiamente aguardando ligações dele enquanto roía o sabugo de todas as minhas unhas. se antes eu podia planejar meus dias e fazer grandes escolhas considerando apenas o que eu queria, depois eu precisava ao menos levar em consideração uma vontade que não era a minha e que por vezes estava com ela em plena contradição. se antes minha própria satisfação e felicidade me bastavam, depois meu bem estar necessariamente dependia do de outra pessoa.
o que não necessariamente significa que uma relação torna a vida mais difícil. na minha língua (aquela que costuma ser utilizada por todo mundo que fala, fala e não diz nada), ganha novos matizes de complexidade. alguns aspectos ficam mais fáceis. outros, incrivelmente difíceis. mudam as questões, e, principalmente, as respostas que apresentamos a elas. mas não se entra numa relação (pelo menos, se entramos pelos motivos certos) porque ela é conveniente. porque, venhamos e convenhamos, em grande parte das vezes, ela não é.
e aí persiste a pergunta, pra que serve uma relação? não tenho idéia. se alguém descobrir, por favor me informe. apesar de que acho que a pergunta tem apenas um valor, o de soar bonitinha. porque a conveniência nunca foi um dos meus critérios pra avaliar qualquer relação. pelo menos, não quando estou apaixonada. mas isso deve ser só eu. sempre digo, eu sou mesmo uma mané. talvez seria melhor que meus próximos namorados fossem escolhidos com base nisso, em como tornariam minha vida mais fácil. o que talvez significasse o fim da relação à vista da primeira dificuldade. isso, por sua vez, talvez, a longo prazo, inviabilizasse qualquer relação.
o que é que os filmes americanos sempre dizem, na saúde ou na doença, na riqueza ou na pobreza, na alegria e na tristeza... escolher alguém que a gente queira com a gente, seja tudo fácil ou difícil. deve ser por aí. e não, enquanto tornar a vida fácil. porque no fim não torna. pelo menos não o tempo todo.
mas se não gostaram da conclusão, proponham outra. nesses assuntos, nunca chego a uma conclusão de verdade.