26 de agosto de 2008

...

de minha melancolia sei dizer muito bem. arquiteto largas estruturas em linhas firmes e cores berrantes tracejo em minúcia artesanal detalhes e sutilezas misturo incansavelmente tons e meios tons e meios meios tons e meios meios meios tons até encontrar a cor exata, a textura certa. minha melancolia eu pinto e repinto incansável. minha melancolia eu exibo. despudoradamente. penduro na testa. distribuo panfletos. colo cartazes. anuncio em outdoors.

mas.

de minha alegria.

para dizer de minha alegria me sinto analfabeta. é que alegria é assunto novo, para ela ainda não tenho linguagem. é que alegria eu ainda estou aprendendo. é que alegria ainda estão me ensinando. para ela ainda não tenho palavras. mesmo porque parece palavrão. indecente dizer de alegria em universos delimitados em asfixia por suicídios, corações partidos, estômagos vazios, licitações fraudadas.

mas.

o agora é alegria. profunda. indecente. de que não sei dizer, não ouso dizer, não quero dizer. pensei agora, que estar genuína e plenamente alegre é a mediocridade suprema, que estou certa de ser genuína e plenamente alegre porque em meio à alegria genuína e plena a mediocridade suprema é supremamente irrelevante.

não. é mentira. a alegria é rara. a alegria é rara. a alegria é rara. eu saberia.

a alegria é rara e eu aprendo indecentemente a alegria. à medida que aprendo ganho linguagem para ela. enquanto isso: sorrio em silêncio, aprendendo em quietude diligente que sim, há possibilidade de alegria em universos asfixiados suicidas partidos vazios fraudados. há realidade na alegria. sorrio sem saber dizer. redescobrindo a alegria que há em não saber dizer.

indecentemente me alegro. alegre-se comigo. sorrio. sorria comigo.
sorria.