9 de setembro de 2006

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indevassável solidão. se não acredito em nada além dessa solidão que tanto temo - então porque a temo?
porque a temo.
aqui em cima, ali embaixo: ó o ato falho. porque, de resposta, em pergunta.
escrever é profetizar.
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é o medo. medo. medo. de estar sozinha, de sempre acabar sozinha.
surpresa, sou um clichê de um metro e sessenta em salto quinze.

mas é engraçado: esse terror de acabar sem laços. não me interesso por laços a maior parte do tempo, ao menos não pelos de mentira. mas. há outro tipo? se todas as pontes são de areia, e não fazem nada por mim as pontes de areia, o que resta? indevassável solidão. se não acredito em nada além dessa solidão que tanto temo - então porque a temo? se ela é tão somente o que há pra mim. não me interessa o ficcional onde quero o real, e tudo que se oferece à percepção humana é, na minha catequese pessoal, a mais pura ficção. paradoxo que se retroalimenta, retrovírus, bola de neve, círculo vicioso (e mais um clichê de metro, sessenta e mais quinze).
medo de acabar sozinha. pior: acabar catacrética. altura peso beleza médios. meu grande mérito no mundo: sou tudo; o que não sou? desinteressante. então, me cospe na cara, então. tudo medo de acabar sozinha. à deriva. sozinha e me repetindo. boiando em oceano glacial sobre um imenso iceberg, deus me proteja me proteja me proteja de me tornar uma esquimó velha demais pra acompanhar a tribo falando sozinha pelos cotovelos exatamente sempre as mesmas coisas tremendamente desinteressantes.
e a dúvida: já não sou? não tenho sido? não continuarei sendo?
e a suprema desinteressância. me cospe na cara.
me percebo: sozinha. desinteressante. desinteressante. sozinha. quantas mais opções tornar possível alguma análise combinatória de poucas opções. monótona interminável.
seria questão de escolha, escolher, entre laços de areia que não me dizem squat, entre essa solidão que abomino. sabendo. que o real não oferece escolha, escolha pressupõe opções diversas, e nos dois lados o que existe é a mesmíssima coisa.

submerjo um dos pés no oceano glacial ao redor do meu iceberg. e o recolho. me sinto velha, não sirvo à tribo. melhor: servi algum dia? (parece óbvia a resposta, desnecessidade de verbalizá-la)
mas não sirvo a ninguém. nunca fui boa serviçal.

testo um horizonte que não se disponibiliza para testes. permaneço à deriva.
gelo que segue em suspensão.

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o que me é dado, é o que quero.
o que me é dado, é o que quero.
o que me é dado, é o que quero.
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ando fugindo de gente. gente é um bichinho incômodo, talvez seja a definição exata. gente faz barulho. gente é tóxica. gente é de uma desinteressância, de um descompromisso. de uma atraoiçoabilidade sempre renovada. só você se distrair, pá, lá está de novo, a faca. nas suas costas. entre as escápulas.
gente é uma inesgotável zona de desconforto.
mas o desconforto vem de nós, alguma mentezinha um pouco mais comezinha e sagaz, argumentaria.
ao que contra-argumento (contra-argumento?)
nossa imagem só nos é acessível via espelhos.
ando fugindo de gente.
e de espelhos.
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me ensinem, por favor, onde jogo fora o uniforme de diretora de internato. ninguém quer perceber-se isso, investido assim, nessa função. o carrasco. o castrador. eu muito menos. quero minha inflexibilidade dentro daquela lixeirinha verde feita pra abrigar giletes e pilhas que levam um zilhão de anos pra degradar: lá onde se jogam detritos de toxicidade nuclear, bem longe longe longe. porque a castração é assim, em um segundo executada, em zilhões de anos superada. se é que é superada. não. não.
é um trabalho sujo, sim. sim, alguém há de fazê-lo, sim. sim.
mas eu não.

... apesar de ser boa nele.

não.