31 de agosto de 2003

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nothing works on a sunday. but then again, sometimes some things do.

30 de agosto de 2003

UM PARÊNTESE

alarme dado pelo carlos. estou meio cética, mas se for verdade, aconteça o que acontecer, estarei surtando por lá.
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meu amor se alimenta de abismos.
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amo você e me estendo sobre os abismos que nos separam e são os abismos o que nos une no fim. meu amor é esse me estender sobre abismos, todos os abismos do mundo. meu amor precisa de abismos para existir, para se alimentar, para sobreviver. meu amor precisa de abismos.
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então amo você, então é isso? me estendo sobre fendas sem fundo para alcançá-lo e o alcanço sem nunca tê-lo encontrado. então amo você, mesmo sem saber o que é amor e o que são abismos e quem é você e quem sou eu. amo você e saber é despiciendo, saber me parece cada vez mais e mais irrelevante. saber quando dizer, saber como dizer, saber dizer mesmo, dizer é irrelevante, dizer é apenas concatenar palavras em busca de um sentido que jamais será alcançado por palavras. dizer é concatenar significantes em busca do significado indizível. dizer é concatenar significantes que tornam inalcançável o significado. então não digo, desisto de dizer, mas estendo, me estendo, e no meu silêncio absoluto espero ter dito tudo e espero alcançá-lo. porque o que eu quero dizer a você é o indizível. é que amo você, é isso, e isso, isso é indizível. mas amo você. e não digo. e me estendo.
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amor deve ser isso, estender a mão para atravessar abismos que não podem ser superados, que são superados pelo mero estender de mãos, que por isso mesmo não são superados jamais. amar deve ser se estender para superar abismos insuperáveis sem superá-los porque superá-los não é o que importa. o que importa é se estender para. amor deve ser isso.
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e eu queria saber dizer, queria ser capaz de vencer toda a infinitude que nos separa, estender a mão, atravessar abismos, e alcançá-lo. sei que você existe em algum lugar infinitamente remoto e surpreendentemente próximo, sei que você está aqui comigo mesmo enquanto eu mesma não estou e percorro universos a sua procura, sei que eu o procuro enquanto você nunca deixou de estar comigo. e sei que por mais próximo que você esteja, todos os abismos persistirão e você ainda assim estará infinitamente próximo e surpreendentemente remoto. e eu queria saber dizer, há tanto que eu queria saber dizer. há tanto a ser dito. queria contar a você tudo, queria mostrar a você tudo, queria que você tivesse visto tudo, esse tudo que me fez sorrir e que me fez chorar e que me massacrou e que me salvou e que me matou e que me pariu desde a última vez em que saí em vão a sua procura. queria saber dizer tudo, queria saber dizer que não sou mais eu, não sou mais aquele eu que você não conheceu e que sou agora um eu novo que você também não conhecerá porque nunca seremos capazes de nos estender as mãos. e queria que você visse, olha só quanto já percorri do caminho, quanto já venci do caminho, quanto do caminho ainda não me venceu. queria saber dizer, olha só quanto cresci, quanto cresci desde a última vez em que não nos encontramos, quanto cresci desde a última vez em que não nos enxergamos e não sentamos lado a lado e não nos estendemos as mãos e não atravessamos os abismos que nos separavam para nos alcançar. queria tanto tanto tanto saber dizer que eu sei, agora eu sei, agora eu sei que você existe e que nos encontraremos e que jamais nos encontraremos e que isso não importa, nunca é isso o que importa, desde que eu estenda a mão, desde que eu me acredite capaz de vencer os abismos que nos separam e estenda a mão para tocar seu rosto, mesmo que eu jamais toque seu rosto, mesmo que eu não possa tocá-lo verdadeiramente, o que basta é isso, que eu acredite tê-lo tocado por alguns instantes, e que você acredite que eu o toquei, o que basta é isso, só isso, e nós nos teremos tocado, ainda que jamais tenhamos nos tocado. queria saber dizer isso, que basta estender a mão, porque os abismos que não podem ser atravessados não serão atravessados, os abismos insuperáveis serão sempre insuperáveis, mas que o que mantém você infinitamente remoto não são os abismos, o que mantém você insuperavelmente remoto não são os abismos, é a minha incapacidade de estender a mão. e eu queria saber dizer e eu queria saber tentar e eu queria acreditar que você fará o mesmo e talvez os abismos não sejam vencidos e os abismos certamente não serão vencidos mas nós nos alcançaremos à distância e eu não estarei mais a sua procura porque você estará comigo ainda que separado por todos os abismos do mundo. porque estaremos estendidos um na direção do outro e estaremos separados mas não haverá abismo no mundo capaz de nos separar. todos os abismos do mundo, nenhum abismo no mundo. e eu queria saber dizer que agora eu sei. e que sou capaz de estender a mão. que estendo.

29 de agosto de 2003

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acho que com todo mundo é assim. e, quer saber, está bem assim. porque eu só quero ir junto com as coisas, ir sendo junto com elas, ao mesmo tempo, até um lugar que não sei onde fica, e que você até pode chamar de morte, mas eu chamo apenas de porto. então está bem assim, tudo bem assim. sobreviver, até o dia em que eu não sobreviver mais. estar aqui até não estar mais. estar em paz com a absoluta efemeridade de tudo que é matéria. amar as coisas que apodrecem. acho que é isso. acho que com todo mundo é assim. e está bem assim
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acho que com todo mundo é assim, sobrevivemos, sempre e sempre, sempre saimos inteiros, instinto visceral de sobrevivência, é isso, não é? sempre sobrevivemos.

sempre sobrevivemos, até que um dia não sobrevivemos. sobrevivemos até que um dia não. acho que com todo mundo é assim.
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engraçado, que às vezes a sensação é exatamente essa. o navio começou a afundar, sem botes salva vidas, ou nado ou morro afogada. o navio está afundando, afundando, quase afundou, e aí, qual vai ser? o navio afundou. e agora, qual é? e agora? são os caminhos conhecidos, os caminhos seguros, os caminhos estáticos, os caminhos prisão, são eles o que se desfaz, e agora, o que eu faço sem meu caminho?

agora.

agora encontrar um caminho novo. agora nadar. agora não morrer, faça eu o que eu fizer, não morrer agora, não morrer nunca. e eu nunca morro. eu sempre encontro um caminho novo. eu sempre aprendo a nadar. porque, ai de ti, ó velho mar profundo, eu sempre venho à tona de todos os naufrágios.
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"Na primeira noite, ele sonhou que o navio começara a afundar. As pessoas corriam desorientadas de um lado para outro no tombadilho, sem lhe dar atenção. Finalmente conseguiu segurar o braço de um marinheiro e disse que não sabia nadar. O marinheiro olhou bem para ele antes de responder, sacudindo os ombros: 'Ou você aprende ou morre'. Acordou quando a água chegava a seus tornozelos.

Na segunda noite, ele sonhou que o navio continuava afundando. As pessoas corriam de outro para um lado, e depois o braço, e depois o olhar, o marinheiro repetindo que ou ele aprendia a nadar ou morria. Quando a água alcançava quase a sua cintura, ele pensou que talvez pudesse aprender a nadar. Mas acordou antes de descobrir.

Na terceira noite, o navio afundou."


(Caio Fernando Abreu, in Pedras de Calcutá)

28 de agosto de 2003

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só sei que sigo. e que não sei.
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a verdade é que não sei. tateio o caminho às cegas, não sei bem onde estou pisando, não mais. a verdade é que não sei mais, não sei se um dia soube, só sei que, depois de tudo, não sei. agora, e depois de agora, não sei, não mais. só sei que não sei e só sei que sigo, sempre sigo, porque não consigo me fazer parar de seguir. só sigo trôpega enquanto tateio o caminho às cegas. não sei para onde, não sei com quem, não sei por que. tateio o caminho por inércia, mais por inércia do que qualquer outra coisa. caminhava antes, caminho agora, caminho sempre e sempre. se caminho na direção de antes, não sei, não sei. o universo me vendou, me girou uma, duas, ene vezes, me empurrou caminho adentro. se avanço ou se regresso na minha senda? a verdade é que não sei. só sei que sigo. e que não sei.
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"Como te explicar: eis que de repente aquele mundo inteiro que eu era crispava-se de cansaço, eu não suportava mais carregar nos ombros - o quê? - e sucumbia a uma tensão que eu não sabia que sempre fora minha. Já estava havendo então, e eu ainda não sabia, os primeiros sinais em mim do desabamento de cavernas calcáreas subterrâneas, que ruíam sob o peso de camadas arqueológicas estratificadas - e o peso do primeiro desabamento abaixava os cantos de minha boca, me deixava os braços caídos. O que me acontecia? Nunca saberei entender mas há de haver quem entenda. E é em mim que tenho que criar esse alguém que entenderá."

(Clarice Lispector, in A Paixão Segundo G.H.)

27 de agosto de 2003

DEFCON FIVE

adquirir o saudável hábito de responder meus e-mails é a atual prioridade máxima. andam me mandando umas mensagens lindinhas, lindinhas desde o meu aniversário, mas elas se perdem no buraco negro que é a minha caixa de entrada do outlook express. aliás, adquirir o ainda mais saudável hábito de limpar a minha caixa de entrada do outlook express também é prioridade máxima. meu talento para acumular lixo é um troço insuperável.

26 de agosto de 2003

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"i'm telling you now
the greatest thing you ever can do now
is trade a smile with someone who's blue now
it's very easy just."

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isso era pra ser um post interessante, mas, bem, deixa pra próxima. não tá rolando. estou lesa, lesa.

23 de agosto de 2003

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meanwhile, i'm only trying to keep my head above the water. what else is a girl supposed to do?
THE TIMES THEY ARE A-CHANGIN?

bob dylan é O homem. também é minha companhia mais assídua ultimamente, sad as it does or does not sound. ele não é de todo mau, sério. desafina um pouco, mas é parte do charme. e a gaitinha, aquela gaitinha conquista uma garota. a gaitinha, e o jeitinho dele de perguntar, how does it feel to be on your own, with no direction home, like a complete unknown, like a rolling stone. cause i've always been a sucker for guys who ask me questions i can't answer.
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"come gather around people wherever you roam
and admit that the waters around you have grown
and accept it that soon you'll be drenched to the bone.
if your time to you is worth saving
then you better start swimming or you'll sink like a stone
for the times they are a-changing"

22 de agosto de 2003

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o caminho é o caminho, e se o caminho me pede o sangue, eu ofereço os pulsos.
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e eu tenho que parar de chamar shiva, céus, me façam parar de chamar shiva. porque eu chamo shiva, shiva vem, e me arranca dos círculos, e me atira nas rochas que me rasgam a carne e me tiram o sangue. e eu já sangrei tanto que me pergunto até quando poderei sangrar. até quando, eu pergunto até quando - e algo me responde que vai ser sempre assim, que é assim, que é bom que seja. e eu acredito, sempre acredito, o caminho é o caminho, se o caminho precisa do meu sangue, eu ofereço os pulsos, sempre e sempre. mas vai explicar isso para o pedaço que sangra. vai explicar, vai.
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e quem me pergunta, sempre há alguém me perguntando, mas céus, por que pi, olha aí, é essa uma parte da resposta. os círculos e a necessidade de compreendê-los e medí-los e visualizá-los e destruí-los. os círculos, cara pálida, os círculos.
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a parte mais dolorosa de caminhar em círculos é perceber que caminhamos em círculos que se desfazem. que estão se desfazendo. que se desfizeram.
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a parte mais dolorosa de caminhar em círculos é perceber que caminhamos em círculos. é quando os círculos começam a se desfazer. nada mais confortável que os caminhos conhecidos, que exatamente por serem conhecidos não mais acrescentam - mas ser arrancado dos caminhos conhecidos é tão doloroso que mecanicamente optamos pelo conhecido e confortável e estático. mas aí vem o universo e nos arranca deles, e nos atira no desconhecido sem piedade, porque não somos seres merecedores de piedade. eu não mereço piedade, ouviu? - é o que digo para o espelho, para esse meu eu que chora ao tombar nas encostas íngremes do desconhecido, ao ver sua carne rasgada pelas rochas pontiagudas do fundo do desconhecido. eu não mereço, eu não quero, eu cuspo em cima da sua piedade que me apequena, ouviu? ouviu? e a imagem no espelho chora, chora, e ela não escolhe, ela sente, e ela quer o conforto do que ela conhecia, e ela quer colo, ela precisa tanto e tanto de colo, e acima de tudo ela quer que tenham pena dela, por favor, porfavorporfavorporfavor, pobre de mim, tenham pena de mim, eu estou longe de casa de família de amigos de amores eu estou longe de tudo e eu não tenho nada e nem mesmo o pouco que tinha nem isso eu tenho mais. tenham pena de mim. mas eu cuspo em cima dessa piedade pela qual você clama, ouviu? ouviu? eu mereço mais que isso. se serão as rochas pontiagudas a me rasgar a carne, então serão elas, e eu sangrarei em silêncio porque suas súplicas de nada me servem. suas súplicas só me trazem piedade, e eu não quero piedade, porque ela também não me serve. o caminho é o caminho, e eu mergulho nele. e mereço mais do que a mera piedade dos passantes, eu mereço caminhar entre eles. então eu cuspo em cima dessa piedade. o caminho é o caminho, e é ele que eu escolho. e é só ele que quero.

21 de agosto de 2003

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continuo ansiosa, continuo desanimada. e o estranho é procurar por respostas onde sei que não vou encontrá-las, mas ainda assim continuar revolvendo nos mesmos lugares à procura delas. talvez seja apenas que no fundo no fundo não quero encontrar as respostas porque já as encontrei e elas me encaram nos olhos e não quero encará-las de volta. então me refugio na busca. não, vocês não são minhas respostas, não, eu ainda não as encontrei, e mecanicamente continuo a buscá-las em todos os lugares onde elas não estarão porque ela estão aqui comigo, e este é o único lugar onde me recuso a buscar. talvez seja que minha busca seja minha fuga. e se for mesmo isso, escapar, escapar como? como não mais caminhar em círculos? continuo buscando o que talvez eu já tenha na esperança de que o que quer que seja, eu o encontre, e se já o tenho, que algum dia ele se faça concreto no meu campo de visão. e, fé no universo, um dia ele se fará. e por agora, os círculos, sempre os círculos, caminho em círculos. até quando, eu pergunto, até quando?
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ou melhor, escolha existe, sempre existe uma escolha. mas dos males, o menor. então fé no universo.
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fé no universo. até porque não existe escolha.

19 de agosto de 2003

HMMMMMMMMM

família de advogados é o que há. ganhei três presentes do meu pai logo ao acordar: uma visita dele logo de manhã, um vaso de flores e um prazo para segunda feira. agora, adivinhe qual é o de grego.
YOU'RE A BIG GIRL ALL THE WAY

seiscentos e vinte e três anos é uma idade deveras delicada, segundo dizem.

18 de agosto de 2003

SHEILA TAKE A, SHEILA TAKE A BOW

o estranho é estar ansiosa e desanimada ao mesmo tempo. a ansiedade que sempre vem quando algo está começando, e o desânimo de algo estar começando nesse momento, em que tudo que quero é ficar enrolada debaixo das cobertas esperando a tempestade dentro de mim passar, só sair quando estiver quente por aqui de novo.

não consegui dormir decentemente essa noite, de ansiedade e dessa maldita insônia de domingo. deitei lá pelas duas e meia, só consegui dormi lá pelas quatro, acordei cinco e meia, e não conseguia mais adormecer. lá pelas sete e meia da manhã, peguei cobertas e fui para o sofá, que estava mais frio do que o quarto, e enquanto tremia e me encolhia, consegui dormir mais um pouco. acordei batendo os dentes de frio, e voltei para o quarto, cochilei mais uma hora, e levantei definitivamente, com sono, com frio, com o corpo cansado. e com um desânimo, ô.

mas deixa estar, que eu tenho que parar de reclamar. a vida é boa, e eu terei alguns trocados (poucos, mas alguns e meus) na conta bancária no futuro próximo.
CONJUNÇÂO ASTRAL

amanhã começo um regime. estou ligeiramente baiuca, quero aproveitar a oportunidade que se abre com meu presente status de ó-céus-a-vida-me-odeia-eu-sou-uma-bosta-por-que-eu-não-me-mato-etc-etc. poucas parcerias são tão bem sucedidas quanto a de depressão e jejum. na última vez em que esta bela conjunção figurou no meu mapa astral, perdi dez quilos em um mês. nem peço tanto, na verdade. só estou com saudades daquele velho visual anêmico e anoréxico que eu costumava ostentar. na atual conjuntura, estou apenas pálida e pré-anoréxica, and, no, we can't have that, can we? no, sir. porque eu adoro dizer, sim, eu tenho ossos. e voltarei a dizer isso no futuro próximo. yes i will.

17 de agosto de 2003

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e ele me perguntou, a voz macia, macia, e o que você costuma fazer pra isso passar, porque você disse, isso te vem de tempos em tempos, né? então. o que você faz pra isso passar? nada, nadinha. espero passar, sempre acaba passando alguma hora, o que não passa nessa vida. tudo passa. não é o que tia clarice diz, que a via crucis não é um descaminho, é a passagem única? então, é isso, pra fazer passar, espero passar, que um dia passa. um dia tudo passa. você também, sabia? você também vai passar. e por um tempo ele respondeu com silêncio, silêncio intercalado do som baixo da respiração dele, até a respiração dele era macia, macia. até que disse, você sabe que pode contar comigo, me procure sempre que precisar, a qualquer hora, sabe disso, não sabe? e não, não sei. não posso. nos momentos em que realmente precisar de você, você não estará lá, é fato. naqueles momentos em que a vida colocar a faca sobre a minha garganta, não, você não estará lá, serei eu e a vida e talvez minha vontade de desarmar a vida e talvez minha vontade de me render, essa minha vontade louca de permitir que a vida me corte a garganta. mas você não estará lá, não mesmo, serei só eu. só eu. porque sempre que precisamos de alguém só podemos contar conosco, verdadeiramente. porque, céus, ó céus, estamos sozinhos, tão fundamentalmente sozinhos. e dói isso, essa indivualidade pesa tanto, mas tanto, tudo pesa tanto e tanto e eu queria tanto que pesasse menos, mas daqui a pouco vai pesar menos, daqui a pouco passa, tudo passa, tudo passa, tudo passa. você também passa, sabia? você também vai passar. e novamente o silêncio, e novamente a respiração, e novamente a voz, não é desse jeito, você sabe que não, mas já está tarde, me ligue se precisar, você sabe que pode contar comigo sempre, a voz macia, macia. e me impaciento um pouco, penso que não vou repetir de novo e de novo que não, não posso, estou sozinha, etc etc etc, e digo ok, ligo se precisar, eu sei que não vou ligar, ele sabe que não vou ligar, mas minto que vou ligar e ele finge que acredita que vou ligar, e isso nos basta. ficamos bem assim, mesmo enquanto não passa, daqui a pouco passa, daqui a pouco tudo passa. ficamos bem assim e isso passa, é o que penso enquanto ouço o telefone sendo desligado do outro lado da linha, até a batida do telefone dele, macia, macia. e eu penso que eu gostaria de acreditar que vou ligar. que, naquele exato instante, quando a faca estiver encostada na minha garganta, apertando a minha garganta, eu vou ligar. como eu queria, como eu quero acreditar que vou ligar. como eu quero. e eu penso que talvez eu ligue. mas, é, bem, talvez não.

16 de agosto de 2003

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e até quando?
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deus é um cara sacana. se é.
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a ironia da vida é que as coisas só nos vêm quando deixamos de precisar delas, quando elas deixam de ser essenciais. porque, sim, eu sei, deus é um cara sacana. nesse momento, tudo o que quero é não desejar mais nada, what's the use, no use. o que quero eu só terei quando não quiser mais. então não quero querer. quando eu não quiser mais nada, talvez então eu tenha tudo que quero agora. só que eu sempre quero as coisas para agora, para ontem, agora é tudo que temos, não temos mais nada. mas nada me vem para agora. so what's the use?

no use at all.
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odeio me sentir não enxergada. como se olhassem para mim, e esse olhar me atravessasse sem se deter. sem me ver. eu queria tanto, céus, como eu queria. como quero. mas não. e tudo que me vem na cabeça é isso, até quando, até quando? até que me enxerguem, até que eu desista de ser enxergada.
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tem horas em que a gente pensa, pensa, pensa, e tudo que a gente consegue pensar é, até quando?

15 de agosto de 2003

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a idéia de altruísmo, de solidariedade, de generosidade, de desprendimento, tudo me soa risível. tudo o que fazemos, fazemos por nós, e por mais ninguém. tudo o que fazemos pelos outros, fazemos por nós. sempre por nós. é necessário uma mentalidade absolutamente infantilóide para genuinamente acreditar no contrário.
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não agüento a sua dor. sua dor me aniquila. me massacra.
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tento proteger você de mim, do meu egoísmo, da minha obsessão. protejo você com a fúria de uma mãe que guarda sua prole da crueldade do mundo, por um quase instinto inelutável, de proteger a mim mesma; me proteger da sua dor, sua dor me dói mais forte que a minha própria. é instinto, puro instinto, quero aparar os golpes que vão de encontro a você com meu próprio corpo porque eu sei que meu corpo os agüenta, mas e o seu? a minha dor eu agüento, mas e a sua?
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"Movo-me dentro de meus instintos fundos que se cumprem às cegas. Sinto então que estou nas proximidades de fontes, lagoas e cachoeiras, todas as águas abundantes. E eu livre.

Ouve-me, ouve meu silêncio. O que falo nunca é o que falo e sim outra coisa. Quando digo 'águas abundantes' estou falando da força de corpo nas águas do mundo. Capta essa outra coisa de que na verdade falo porque eu mesma não posso. Lê a energia que está no meu silêncio. Ah, tenho medo do Deus e do seu silêncio.

Sou-me."


(Clarice Lispector, sempre Clarice Lispector)
DEFCON FIVE

a prioridade máxima é tomar vergonha na cara.

14 de agosto de 2003

*MEDO*

conheci algumas das pessoas com quem vou trabalhar hoje, parecem simpáticas. quando eu quis saber como era o trabalho, ouvi em resposta algo como, aqui é beeeeem tranquilo, dá pra fazer tudo com bastante folga - o que imediatamente acionou ensurdecedoramente na minha cabeça o alarme de tédio mortal à vista. god, i hope i?m wrong. talvez seja só meu alter ego workaholic obssessivo chiando. veremos.
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"Se tantas vezes te importuno, ó Deus meu vizinho,
batendo forte à tua porta na noite extensa,
é porque te ouço respirar, da tua presença
sei: estás na sala, sozinho.
Se de algo precisares, não há ninguém ali
que possa te trazer um gole d'água sequer.
Vivo sempre à escuta. Dá-me um sinal qualquer.
Estou bem perto de ti.

Entre nós há apenas um muro, coisa pouca,
por mero acaso aliás;
bem pode ser que um grito da tua ou minha boca -
e eis que se desfaz
sem só rumor ou ruído.

Com imagens tuas o muro foi construído.

Diante de ti tuas imagens são como nomes.
E quando um dia dentro de ti esteja acesa
a luz com que te conhece minha profundeza,
será, nas molduras, brilho que se esbanja e some.

E os meus sentidos, que um torpor célere consome,
estão sem pátria, exilados da tua grandeza."


(Rainer Maria Rilke, poeta alemão)

13 de agosto de 2003

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all is full of love, it´s all around you.
AND HEAVEN KNOWS I'M MISERABLE NOW

ok, isso é drama, sim, sim. mas é fato que estou ansiosa. esse bater de ponto pode vir a se repetir todos os dias úteis pelos próximos dois anos. tenho pavor de horizontes que se estendem tão ao longe. tanto acontece em tão pouco tempo. e talvez meus próximos dois anos sejam esse ponto. definitivo, isso. ai minha úlcera.
I WAS LOOKING FOR A JOB AND THEN I FOUND A JOB

sim, voltarei a bater ponto, é o que parece. estou satisfeita com isso - não com a parte do ponto: na verdade, continuo defendendo que essa obrigatoriedade de que atividades laborativas ocorram em horários fixos é profundamente contraproducente e absolutamente incompatível com meu temperamento auto-indulgente, mas enfim, todos conhecemos o imperativo categórico que surge quando o estupro é, sim, inevitável. a oportunidade é boa, e caiu no meu colo sem qualquer espécie de esforço. guess i should try and make the most of it. wish me luck.
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"you'll be given love
you'll be taken care of
you'll be given love
you have to trust it

maybe not from the sources you have poured yours
maybe not from the directions you are staring at

trust your head around, it's all around you
all is full of love
all around you"
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all is full of love.

12 de agosto de 2003

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o segredo é esse, amar sim, amar muito, enquanto houver o que amar, enquanto houver amor para amar. porque o meu amor, maria, o meu amor é sempre o mesmo: as andorinhas é que mudam.
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o segredo é esse, amar, sim, amar muito, e ficar apenas enquanto esse amor fica, e quando o amor passar, passar junto com ele. não permanecer para o vazio que ocupa o espaço de um amor que se foi, que não volta. tudo passa. passemos também. o segredo é esse.

11 de agosto de 2003

E MAIS ISSO

agradeço imensamente a quem foi: vocês fizeram minha noite. queria ter dado mais atenção a todos, mas vocês sabem como é. espero encontrá-los novamente, no futuro próximo, em condições normais de pressão e temperatura e circunstâncias mais propícias a uma longa conversa.
WEEKEND UPDATE

só digo isso. quem não foi sábado, perdeu algumas das cenas mais engraçadas de todos os tempos, daquelas que até o fim de meus dias serão descritas e repetidas em cada minúcia ginecológica entre um refrigerante e outro sobre mesas de bar vida afora.
A CARTA

"Hoje encontrei dentro de um livro uma velha carta amarelecida,
Rasguei-a sem procurar ao menos saber de quem seria...
Eu tenho um medo
Horrível
A essas marés montantes do passado,
Com suas quilhas afundadas, com
Meus sucessivos cadáveres amarrados aos mastros e gáveas...
Ai de mim
Ai de ti, ó velho mar profundo,
Eu venho sempre a tona de todos os naufrágios!"


(Mário Quintana, poeta brasileiro)

8 de agosto de 2003

FOR A CHANGE




essa é a chamada geral: sábado, eu e a menina da saia estaremos comemorando nossos respectivos aniversários, adivinhem onde. é dia de techno, house, eighties e rock. teremos presenças ilustres: dará o ar de sua graça, por exemplo, a graciosa mãe de minha co-aniversariante, uma senhora de sessenta e sete anos que sempre quis saber o que tanto sua filhinha linda e loura faz na bunker todo sábado à noite. hmmmm.

então: essa é sua chance de testemunhar o quebra pau de camarote. e quem sabe, de lambuja, você ainda consiga ver minha tatuagem ao vivo e a cores, ou mesmo (let's go crazy!) tomar café da manhã com a moça mais, digamos, desejada do lugar? quem conhece a bunker, sabe que ali, tudo, sim, tudo, é possível. é, tudo mesmo. mas para o café da manhã, entre na fila: ela começa atrás de mim.

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é uma falha de caráter, na verdade. talvez seja que sou simplesmente incapaz de me obrigar a fazer as coisas. se não quero, não faço, é simples assim, sempre foi. ouço estoicamente a voz dentro da minha cabeça se esgoelando, mas você tem que, TEM que, tá ouvindo?!? tá me ouvindo, TEEEEEEEEEM QUE! tenho é? porra nenhuma. viro pro outro lado pra assistir tv, troco os canais de tempos em tempos, acho que daqui a pouco vai passar uma repridse de seinfeld, eba.
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ando sem paciência para ser politicamente correta, para obedecer protocolos e regras de etiqueta. também estou numa fase meio entocada. pra dar uma idéia, passei os últimos três dias praticamente trancada em casa simplesmente porque não conseguia conjugar um mínimo de força de vontade a motivos suficientes para sair ao mundo. aos afetados, peço desculpas. espero que entendam e que isso mude no futuro próximo.
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these are very strange times indeed.
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"and maybe some faith would do me good
i don't know what i'm doing,
don't know should i change my mind,
i can't decide, there's too many variations to consider
no thing I do don't do no thing but bring me more to do,
it's true, i do imbue my blue unto myself, i make it bitter"

6 de agosto de 2003

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tento escapar de você enquanto me agarro às grades que são os feixes de luz e sombra no fundo do seu olhar. e não desvio meu olhar. e não escapo. ainda.
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alguns poemas me perseguem. alguns poemas e frases e vozes e gestos e sombras. algumas sombras me perseguem, me imobilizam. a sombra por trás da claridade no seu olhar, ela me imobiliza. me persegue. ela e o jeito como sua respiração hesita depois de dizer que, antes de me dizer que. o jeito como sua voz hesita quando você me diz que. o jeito como você me diz que. você. o jeito como você não me diz, como não sabe me dizer. você me persegue, me imobiliza, me aprisiona. e tento escapar de você enquanto me agarro às grades construídas pelos feixes de luz e sombra no fundo do seu olhar.
...

"Now i lay(with everywhere around)
me(the great dim deep sound
of rain;and of always and of nowhere)and
what a gently welcoming darkestness--

now i lay me down(in a most steep
more than music)feeling that sunlight is
(life and day are)only loaned:whereas
night is given(night and death and the rain

are given;and given is how beautifully snow)

now i lay me down to dream of(nothing
i or any somebody or you
can begin to begin to imagine)

something which nobody may keep.
now i lay me down to dream of Spring"


(e. e. cummings, poeta americano)

5 de agosto de 2003

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was it a vision, or a waking dream? fled is that music: - do i wake or sleep?
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e ainda é madrugada, e o silêncio ainda me tira o sono, e a expectativa pelo fim insondável ainda me tira o fôlego, e então eu novamente o desejo, eu novamente imploro a ele, to take into the air my quiet breath. please do. sim, eu sei, logo o dia amanhece. e logo esqueço. mas ainda não. ainda estou tentando esquecer. não esqueço ainda. e ainda anseio. e ainda pergunto, fled is that music, do i wake or sleep? e ainda imploro. ainda imploro. mas estou me repetindo. estou sempre me repetindo.
PRESENÇA

"É preciso que a saudade desenhe tuas linhas perfeitas,
teu perfil exato e que, apenas, levemente, o vento
das horas ponha um frêmito em teus cabelos...
É preciso que a tua ausência trescale
sutilmente, no ar, a trevo machucado,
a folhas de alecrim desde há muito guardadas
não se sabe por quem nalgum móvel antigo...
Mas é preciso, também, que seja como abrir uma janela
e respirar-te, azul e luminosa, no ar.
É preciso a saudade pra eu te sentir
como sinto - em mim - a presença misteriosa da vida...
Mas quando surges és tão outra e múltipla e imprevista
que nunca te pareces com o teu retrato...
E eu tenho de fechar meus olhos para ver-te!"


(Mário Quintana, poeta brasileiro)
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on the bright side, hoje é aniversário da menina da saia. go pay your respects.
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inércia inércia inércia inércia inércia inércia inércia inércia inércia inércia inércia inércia inércia inércia inércia inércia inércia inércia inércia inércia inércia inércia inércia inércia inércia inércia inércia inércia inércia inércia inércia inércia inércia inércia inércia a inércia inércia inércia inércia inércia inércia

3 de agosto de 2003

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this might take me a little time. but it's only a while. it's only a while.
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é, aquele poeminha ali embaixo é famoso, famoso, mas fazer o quê, cara pálida, ele define. e hoje eu não estou muito preocupada com a vala comum, não, porque estou estirada numa das maiores delas: o bode domingueiro. então não chegue o rosto muito perto do computador, que depressão é mal altamente contagioso. a coisa pega. como pega.
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"Looking up at the stars, I know quite well
That, for all they care, I can go to hell,
But on earth indifference is the least
We have to dread from man or beast.
How should we like it were stars to burn
With a passion for us we could not return?
If equal affection cannot be,
Let the more loving one be me.

Admirer as I think I am
Of stars that do not give a damn,
I cannot, now I see them, say
I missed one terribly all day.

Were all stars to disappear or die,
I should learn to look at an empty sky
And feel its total dark sublime,
Though this might take me a little time."


(W. H. Auden, poeta americano)

1 de agosto de 2003

O QUE ME LEVA À CARTA DO MOMENTO



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me estendo acima de tantas das minhas ambigüidades, me faço ponte a conectar tantar das minhas contradições, que não sei dizer. queria conseguir explicar, como isso tudo se compatibiliza na forma mais harmônica dentro de mim, mas não, não consigo. o essencial, o fundamental, a raiz é impronunciável. descemos às profundezas, mergulhamos nelas, bebemos delas, nos afogamos nelas... - e voltamos, com algo, algo muito precioso, mas que é impronunciável, intransmissível, personalíssimo. tento explicar às pessoas, elas pensam que entendem, mas não. sim, é isso, digo em sorriso condescendente e esfíngico, é isso mesmo, deixe pra lá, é isso mesmo. mas não é isso, não é. é algo que é só meu e que é inalienável. é uma sinfonia, é isso. volto com a memória de uma sinfonia que não consigo tocar para os outros porque não posso me fazer de orquestra, porque não me recordo das notas exatas que vibravam em cada instrumento, porque não consigo traduzir o que escutei em partitura. mas me lembro da música. a música ressoa em mim, é minha. é necessário descer às profundezas e retornar com a sinfonia impronunciável. é necessário descer às profundezas.
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"Eu tenho à medida que designo - e este é o esplendor de se ter uma linguagem. Mas eu tenho muito mais à medida que não consigo designar. A realidade é a matéria-prima, a linguagem é o modo como vou buscá-la - e como não acho. Mas é do buscar e não achar que nasce o que eu não conhecia, e que instantaneamente reconheço. A linguagem é meu esforço humano. Por destino tenho que ir bnuscar e por destino volto com as mãos vazias. Mas - volto com o indizível. O indizível só me poderá ser dado através do fracasso de minha linguagem. Só quando falha a construção é que obtenho o que ela não conseguiu.

E é inútil procurar encurtar caminho e querer começar já sabendo que a voz diz pouco, já começando por ser despessoal. Pois existe a trajetória, e a trajetória não é apenas um modo de ir. A trajetórias somos nós mesmos. Em matéria de viver, nunca se pode chegar antes. A via-crucis não é um descaminho, é a passagem única, não se chega senão através dela e com ela. A insistência é o nosso esforço, a desistência é o prêmio. A este só se chega quando se experimentou o poder de construir e, apesar do gosto de poder, prefere-se a desistência. A desistência tem que ser uma escolha. Desistir é a escolha mais sagrada de uma vida. Desistir é o verdadeiro esforço humano. E só esta é a glória própria de minha condição.

A desistência é uma revelação."


(Clarice Lispector, in A Paixão Segundo G.H.)